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O que está acontecendo com a Nicarágua? Entenda a crise que aflige o maior país da América Central

O regime de Daniel Ortega é acusado de violações contra os direitos humanos. A Nicarágua enfrenta uma de suas piores crises, entenda o que está acontecendo.

Por
Redação Brasil Paralelo
Publicado em
14/2/2023 19:02

Daniel Ortega, ex-líder revolucionário e atual presidente da Nicarágua, foi reeleito em 2021 para seu 5º mandato, o 4º consecutivo. Os Estados Unidos, a União Europeia e a Organização dos Estados Americanos (OEA) não reconheceram as eleições e apontaram possibilidades altas de fraude no processo.

Para permanecer por tanto tempo no poder, o próprio presidente alterou a constituição nicaraguense para permitir mais reeleições para seu cargo. Próximo ao pleito de 2021, Ortega decretou a prisão dos seus principais opositores.

Daniel Ortega governa desde 2007 e, de 2018 aos dias atuais, vem sendo acusado de promover a perseguição sistemática à mídia tradicional e independente, religiosos e opositores.

A Brasil Paralelo resolveu falar o que ninguém está falando sobre a crise que vive o povo nicaraguense. O que está acontecendo com a Nicarágua?

O que você vai encontrar neste artigo?

Como está a Nicarágua hoje?

Desde 2018, a repressão do governo nicaraguense vem escalando. Segundo apuração do jornal G1, de 2018 até o presente, mais de 100 mil nicaraguenses foram exilados. Opositores, críticos do regime, religiosos e até antigos aliados de Ortega estão entre os expulsos do país.

Em abril de 2018, a população nicaraguense se manifestou contra a nova política previdenciária do país. Um protesto pacífico, que reivindicava uma mudança de postura do governo, resultou numa forte repressão policial e na morte de mais de 300 pessoas.

Na cidade de León, a Rádio Darío fez a cobertura dos protestos e noticiou os episódios de violência.

O diretor da rádio, Aníbal Toruño, relatou em entrevista exclusiva à Brasil Paralelo como um grupo de apoiadores de Daniel Ortega incendiou sua rádio como forma de represália pela cobertura dos protestos e como o plano envolvia queimar a rádio com os radialistas dentro.

“Havia uma porta que levava à casa vizinha e fazia divisória (com a rádio), ela havia sido selada”, relatou o diretor.

A perseguição aos meios de comunicação e o cerceamento da liberdade de expressão são apenas alguns dos crimes associados ao regime de Ortega. O governo promove também a:

  • perseguição de opositores;
  • repressão de quem discorda do atual governo;
  • compra dos meios de comunicação;
  • criação de leis que permitam a expansão e duração do regime de Ortega;
  • perseguição de religiosos e defensores dos direitos humanos;
  • expulsão de ordens religiosas;
  • proibição do culto;
  • fechamento de ONGs e associações pró-direitos humanos;
  • restrição do ingresso ao país com objetos que possam registrar imagens e vídeos;
  • perseguição de familiares de opositores ao regime.

Muitos exilados nicaraguenses consideram a Nicarágua como uma das piores ditaduras do século XXI.

Para entender como está a Nicarágua hoje é preciso compreender as recentes ações do governo em cada um desses pontos.

O que está acontecendo com a Igreja na Nicarágua?

“Tudo se impõe na Igreja Católica, é uma ditadura perfeita”, afirmou Daniel Ortega em cerimônia pública no dia 28 de setembro de 2022.

Para acabar com a interferência da Igreja Católica na Nicarágua, o governo de Daniel Ortega já promoveu prisão de religiosos, o fechamento de canais de televisão e emissoras de rádio católicas, a expulsão de missionários e o rompimento das relações diplomáticas com o Vaticano, ao expulsar seu embaixador.

A rusga com a Igreja se agravou em 2018. Setores da Igreja Católica apoiaram as manifestações daquele ano.

À época, o presidente nicaraguense disse que os manifestantes "saíram das igrejas, não de todas, armados para lançar os ataques contra as delegacias de polícia (...) e alguns padres convocando o povo (para) atirar em mim".

Ele também censurou os religiosos por terem apoiado a proposta da oposição de reduzir seu mandato, quando atuaram como mediadores de um diálogo que buscava uma solução para a crise.

No discurso de setembro de 2022, Ortega voltou a criticar a postura da Igreja Católica:

“Um golpe de Estado! Uma instituição como a Igreja Católica utilizando dos seus bispos aqui na Nicarágua para encenar um golpe de Estado. Desde quando bispos e padres têm poder para impulsionar um golpe de Estado?”

Em agosto de 2022, a Polícia Nacional da Nicarágua cercou a casa episcopal do bispo de Matagalpa, Dom Rolando Alvarez.

O sacerdote foi mantido por meses nessa condição. Dom Rolando é um crítico de Daniel Ortega e um dos defensores dos direitos humanos da população nicaraguense. O sacerdote foi acusado de usar as redes sociais e o púlpito da Igreja para promover "atividades desestabilizadoras e provocativas".

Até o final de 2022, a Igreja Católica já recebeu quase 200 ataques da ditadura de Daniel Ortega, segundo um relatório da ONG Observatorio Pro Transparencia y Anticorrupción.

18 missionárias da ordem fundada por Madre Teresa de Calcutá foram expulsas do país e obrigadas a sair da Nicarágua a pé. Elas cruzaram a fronteira até a Costa Rica escoltadas pela polícia nacional.

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Missionárias da Caridade sendo expulsas a pé da Nicarágua.

No fim de 2022, o governo nicaraguense começou a proibir que católicos e evangélicos celebrassem cultos públicos.

Dom Rolando foi condenado neste ano (2023) a 26 anos e 4 meses de prisão. O regime de Ortega permitiu que o Bispo fosse exilado para os EUA, mas o sacerdote se recusou e foi condenado por “difundir notícias falsas na internet, obstrução agravada de funções em detrimento do Estado e da sociedade nicaraguense e desacato à autoridade”.

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A prisão de Dom Rolando José Álvarez Lagos em 2022

No dia 8 de fevereiro, o regime de Ortega condenou sete religiosos a 10 anos de prisão. Eles foram presos após criticar o regime nas redes sociais e nas suas comunidades.

A perseguição à Igreja é um retrato de como está a Nicarágua hoje.

O que o Papa fala sobre a Nicarágua?

Em 2023, o Papa Francisco rompeu o silêncio sobre a Nicarágua pela primeira vez e relatou suas preocupações sobre as vítimas do regime de Daniel Ortega. No dia 12 de fevereiro, domingo, o Pontífice rezou a tradicional oração do Ângelus e declarou:

“As notícias que chegam da Nicarágua me magoaram muito e não posso deixar de lembrar com preocupação o bispo de Matagalpa, Rolando Álvarez, que amo muito, condenado a 26 anos de prisão, e também as pessoas que foram deportadas para os Estados Unidos”.

Segundo apuração do jornal Il Sismografo, o Estado do Vaticano buscava estabelecer relações com Ortega pela via diplomática, mas a condenação de Dom Rolando Álvarez prejudicou os progressos da relação.

A perseguição e o fechamento de rádios e canais de televisão não se restringiu às emissoras católicas.

O fim da liberdade de expressão na Nicarágua?

Como já foi dito no início do artigo, o regime de Daniel Ortega é acusado de atear fogo na Rádio Darío. Segundo investigação do jornal nicaraguense Confidencial Digital, foi a sexta vez que grupos pró-Ortega incendiaram a rádio.

O governo de Daniel Ortega, para controlar a veiculação de informações em seu país:

  • comprou meios de comunicação;
  • cortou o canal da CNN;
  • criou leis limitando a liberdade de expressão;
  • perseguiu jornalistas;
  • fechou canais e rádios considerados críticos ou opositores.
“Nós, como jornalistas, notamos uma mudança quase de imediato porque começaram a fechar as portas das instituições que, por muitos anos, haviam nos fornecido informação para fazer o nosso trabalho.

Tomaram a publicidade estatal dos meios independentes e deram uma orientação às instituições de que só compartilhassem informação com meios que eram leais ao projeto político do governo.

Também vimos que havia uma retórica na qual nós éramos vistos quase como inimigos.”

Em entrevista exclusiva à Brasil Paralelo para o novo documentário NICARÁGUA: Liberdade Exilada, Camilo de Castro Belli afirmou como a partir de 2018 o regime de Ortega fechou o cerco contra os jornalistas e a liberdade de expressão.

As principais ações vistas como meios de cercear a liberdade de imprensa e expressão foram:

  • criar novas leis para restringir a divulgação de informações e notícias;
  • retirar a publicidade estatal dos meios independentes de comunicação;
  • orientar as instituições do governo a divulgar informações apenas a canais leais ao projeto político do governo;
  • comprar meios de comunicação.

Jennifer Ortiz dividiu em entrevista exclusiva à Brasil Paralelo como o governo se relacionou com o jornal em que trabalhava:

“Eu trabalhava no primeiro meio de comunicação que Daniel Ortega comprou naquele momento, que foi em 2009. E eu me lembro que o diretor, proprietário desse veículo, chorou e nos confessou que tudo aconteceu por conta da pressão extrema sofrida”.

Elvira Cuadra, socióloga nicaraguense, divide as irregularidades da compra dos canais de comunicação em entrevista para o novo Original BP “NICARÁGUA: Liberdade Exilada”:

“Para conseguir o controle desses meios, utilizaram diferentes mecanismos como pressão, chantagem, o uso da publicidade estatal como castigo, extorsão. E isso começou a gerar nos meios nicaraguenses um processo muito rápido de autocensura”.

Segundo investigação do jornal El País, o governo de Ortega montou em 2020 um tripé legislativo para minar a liberdade de expressão no país:

  1. Lei contra Discurso de Ódio: Ortega enviou ao parlamento um projeto de lei para punir com prisão perpétua aqueles que praticarem “discurso de ódio” e atentarem contra a “segurança do Estado”. O juízo que declara o que é ou não discurso de ódio parte de tribunais comandados pelos governantes;
  2. Lei de Agentes Estrangeiros: proíbe o financiamento e as doações internacionais à sociedade civil, ONGs, jornalistas e especialmente grupos de oposição;
  3. Lei Especial de Delitos Cibernéticos: apelidada de Lei da Mordaça, a lei pune conteúdos publicados na internet que forem considerados falsos pelo governo, a pena prevista é de 1 a 10 anos de cárcere.

“Quem, usando as tecnologias da informação e da comunicação, publicar ou difundir informação falsa e/ou tergiversada, que gere alarme, temor, desânimo na população, ou a um grupo ou setor dela, a uma pessoa ou a sua família, ficará sujeita à pena de dois a quatro anos de prisão e 300 a 500 dias de multa”, diz o artigo 30 da lei. Nos artigos seguintes a pena é elevada a até cinco anos de prisão.

“A aprovação desta lei constitui uma forma de endurecimento das relações dos governantes com a imprensa. Uma medida destinada a calar vozes, que vai além de suas fronteiras para se inscrever num universo maior: o conjunto da sociedade nicaraguense”, disse ao El País o especialista em meios de comunicação Guillermo Rothschuh.

Da mesma forma que a liberdade de expressão e imprensa foram sendo gradualmente tomadas pelo governo, o poder na Nicarágua passou pelo mesmo processo.

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